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Irmão por parte de irmão
28/05/2024 - 09:00
Ana Lúcia Ricarte

 A inocência das crianças é encantadora, e sua capacidade de adaptação, surpreendente. Elas nos ensinam muito sobre a vida familiar, acolhendo com carinho as mudanças culturais das nossas famílias brasileiras. Em meio às transformações, é notável como aceitam, sem hesitação, aqueles que passam a fazer parte de seu círculo familiar.

Ao longo dos meus anos no direito das famílias, observei que as crianças geralmente não têm preconceitos em relação às novas formações ou convivências familiares. Elas são frequentemente contaminadas pelos preconceitos e abusos emocionais dos adultos ao seu redor. Uma criança não se sente traída quando os pais explicam, com diálogo e amor, o motivo pelo qual não ficarão mais juntos. Elas são, muitas vezes, induzidas a sentir-se mal ou a presenciar dramas familiares que não pertencem ao seu mundo lúdico.

Certa vez, no parque, ao conversar com uma criança de sete anos, ele me apresentou seu irmão e, intrigantemente, o “irmão por parte de irmão”. Quando perguntei o que significava, ele respondeu com simplicidade: “Aquele menino lá não é meu irmão por parte dos meus pais, mas é irmão do meu irmão por parte da mãe dele. Ele não é filho do meu pai, mas é filho da mãe do meu irmão. Entendeu?” Fiz que sim com a cabeça, mas fiquei intrigada com a clareza daquela explicação.

Naquele momento, lembrei-me do saudoso professor e doutrinador Cristiano Chaves, que dizia: “Os meus filhos, os seus filhos e os nossos filhos…” A naturalidade e o carinho com que a criança falava daquele que integrou seu mundo familiar me emocionaram. Ele e seus pais haviam encontrado um lugar para aquele que tem um irmão em comum, mesmo não sendo irmãos de sangue.

Em busca do projeto de felicidade, os pais têm reconstruído seus lares, realizando as adaptações necessárias para que o amor e o respeito prevaleçam, assim como os laços de afinidade. Imagine! Aquele que é irmão do meu irmão, mas não meu irmão, tem algo muito importante em comum comigo, certo? Os laços de irmandade são essenciais para o ser humano, então, aquele que não é meu irmão, mas é irmão do meu irmão, deve ser considerado um membro importante no contexto de convivência em irmandade.

Devemos ensinar às nossas crianças mais do que o conceito de família previsto em qualquer código ou constituição federal. Devemos ensiná-las sobre o amor. O amor não aceita limites, preconceitos ou julgamentos. Amar e respeitar o próximo envolve compreender as mudanças, adaptar-se e ter a segurança necessária para que a vida possa ser vivida de forma plena e feliz.

Em uma simples conversa no parque com uma criança, pude, em poucos minutos, conhecer uma criança que vive em uma família onde é tratada com respeito e onde todos se acolhem. Exemplo de acolhimento como esse é raro de se ver.

FONTE: Ana Lúcia Ricarte
EDIÇÃO: Ana Lúcia Ricarte
Ricarte Advocacia
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